Depois das semanas de desfiles europeias e a americana, em que os destaques não chegavam a 10 em cada cidade – Paris, Londres, Nova York, Milão – a chinesa Xangai foi alvo de coberturas dos sites internacionais, principalmente Vogue e WWD. No circuito da imprensa especializada, esperava-se que, do Oriente, as semanas de Hong Kong, Tóquio e Cingapura fossem as novas referências das tendências. E aí, de oito a 16 de outubro (nove dias, mais do que os eventos europeus e americanos!) vemos a primeira edição da Shangai Fashion Week depois de passadas as restrições da Covid, com 1000 participantes, showrooms espetaculares e até uma moda de rua digna dos paparazzi mais exigentes. 

Além dos desfiles com propostas clássicas, conceituais ou extravagantes, há um senso de realidade de acordo com estes tempos estranhos. Edison Chen, um dos criadores mais ativos da China, comentou: “Não sabemos se nossas coleções vão vender. Mas estamos apresentando o nosso trabalho.”.  A prova da vontade de atender a uma clientela menos milionária é o empenho em aumentar a faixa de preços, começando a oferecer peças mais baratas. 

Importante nas coleções chinesas: crochê, malhas metálicas (mesh), cores delicadas ou vibrantes, saias evasês, década de 1990, figurinos de cinema, pretinho básico, ainda muito jeans. Tradição, minimalismo e genderless.

Vejam alguns destaques citados pelos grandes sites internacionais. 

Elegância em preto e branco, da Comme Moi (reprodução IG)

COMME MOI: marca da modelo Lu Yan, apoiada pelo Chenfeng, o grupo mais poderoso da China, celebrou 10 anos de trabalho com uma apresentação para mil convidados. Muito jacquard e crochê metálico em preto e branco, couro luxuoso e alfaiataria para as elites urbanas locais. Inspiração: anos 1990.

Edison Chen, designer poderoso, com a cápsula com a Adidas. Quero tudo! (reprodução IG)

EDISON CHEN: celebrou 20 anos de sua marca Clot convidando grifes nacionais e internacionais – como Tommy Hilfiger – para reinterpretar seu logo. Apresentou a colab com a Adidas, sandálias de palha e muito estilo athleisure (atlético urbano). A colaboração com a Adidas vai além do design de roupas: Chen vai trabalhar no Innovation Lab baseado em Xangai, para que a marca alemã entre em contato com os talentos locais. “Esperamos descobrir de cinco a oito nomes que nos representem. Atualmente temos o projeto Earn your stripes (ganhe suas listras, referência às listras da Adidas). Se surgir um artista plástico, vamos montar uma exposição; se for um fotógrafo, ele será escolhido para fotografar o catálogo. “

Belo final da Icicle (reprodução site)

ICICLE: marca com 26 anos estreou na SFW (Shanghai Fashion Week), mostrando vestidos inspirados em pipas, trenchcoat transparente e um terno assimétrico em tom de névoa de verão. A francesa Bénédicte Laloux é a diretora de criação.

Uma das bolsas no estilo da ShuShu Tong (foto Farfetch)

 

SHUSHU/TONG: Inspiração na série Big Nude, do fotógrafo Helmut Newton levou a dupla Lei Liushu e Yutong Jiang a usar rendas como base para esculpir modelos que são ao mesmo tempo sensuais e modestos. Segundo os autores, o sonho das suas garotas é ser uma boneca que adora a bolsa com um laçarote borboleta e os óculos enfeitados com pérolas.

Plumas e tons suaves na coleção da Xu-Zhi

XU-ZHI: Taoismo e os ensinamentos do ying-yang são as bases da elegante série de franjas de plumas de avestruz, camisas masculinas com paetês e minissaias bordadas com miçangas. Lindo trabalho

OUDE WAAG: marca de Jingwei Yin, aluno do Royal College of Art. Inspiração na cultura Ama, das mulheres japonesas que mergulham buscando pérolas. Drapeados em alfaiatarias e vestidos lembram as texturas das cascas dos moluscos abalones e aplicações imitam as pérolas. É uma grife cara, mas mostrou moda de praia com estampas gráficas com preços razoáveis. Vale a pena ver o video. 

https://www.youtube.com/watch?v=8YxR9nQ4kpE

Looks da coleção Orgasmic, de Louis-Shentagtao-chen

LOUIS SHENGTAO CHEN: semifinalista no prêmio do grupo LVMH, apresentou a coleção Orgasmic em um armazém histórico de um Banco com vista para o rio Bund. Vestidos em tecidos amarrotados ou com muitos cristais Swarovski, um rosto preenchendo um modelo. “Além do prazer sexual, é um caminho entre auto-conhecimento e auto-evolução”, explicou Shengtao Chen, que lembrou do filme “Silêncio dos Inocentes”. 

Uma das opções imaginadas para as executivas. Ui!

MARK GONG: reinterpretou o figurino de Samantha Jones do filme Sex and the City, que ele assistiu quando tinha 11 anos. Principalmente a cena em que ela perde o lance de um anel de brilhantes para o namorado. O resultado é a coleção perfeita para executivas, que também acham que uma mulher deve comprar suas próprias joias. Nos destaques, pretinhos transparentes, tricôs franjados, um minivestido de paetês vermelhos, uma saia com a letra M do logo e um look de jeans com correntes de metal. Tudo, com lindas meias e muita bijuteria. Gong estudou na Parson’s.

Estilo da Ponder.er. Gosto muito da foto

PONDER.ER: Alex Po e Derek Cheng ganharam um prêmio como melhor marca genderless e encaram a primavera/verão de 2024 como a busca pelo seu próprio paraíso na Terra. Elenco inclusivo, muito jeans combinado com crochê

A elegância para a geração G, na coleção de Haizhen Wang

HAIZHEN WANG: ganhou o prêmio francês Fashion Fringe e renovou o pretinho básico com técnicas de Madeleine Vionnet e Madame Grès, visando encantar a geração G chinesa. 

Moda para os tristes, na Danshan. Bela foto (IG)

DANSHAN: é baseada em Londres, assinada por Danxia Liu e Shan Peng Wong, que se dedicam à moda masculina. A coleção fala com os “tristes modernos e o guarda-roupa que estes românticos partilham com seus amores”. Em um cenário de quarto, os modelos atuavam como se estivessem em um sonho, vestindo camisetas, regatas e hoodies de cetim, chifon e tule. Adorei.

Jacques Wein, desfilou em jardins da dinastia Qing

JACQUES WEI: a locação já serviu para o desfile da Hermès, um galpão no jardim da casa da família Sheng, da dinastia Qing. Wei imaginou uma noite de verão com novas possibilidades e muitas paixões. Peças de Arte da sua coleção, plantas e animais vistos em pinturas orientais e a colaboração com  o artista contemporâneo Jiang Cheng foram as bases da coleção nas cores do sol das três horas da tarde e dos lírios na fonte, quando visitei o jardim. Destaque para os colares de jade em forma de flores, pássaros, peixes, da iconografia chinesa.

Shie Lyu, corte de sereia com borboletas nos bolsos

SHIE LYU: um pouco história de terror: ela esfaqueou borboletas que colecionava! “A faca representa perigo e nitidez, as borboletas, tentação e grandeza. Fui atraída por esta beleza de colisões”. E lá foi a Lyu inventar jaquetas de couro e tweed, borboletas em tops e corpetes, saias de sereia e outra saia com bolsos de PVC recheados com asas de borboleta.

Nome da marca de Chen Sifán: Not just a Label

CHEN SIFÁN: recém-saído da Central San Martin, fez um masculino inspirado na ópera Madame Butterfly. Esquemas de cores e bordados tradicionais chineses e técnicas de crochê que lembram a herança nativa 

Susan Fang desfilou em Londres e Xangai

SUSAN FANG: depois de desfilar em Londres, Susan transformou a apresentação em exposição de arte, dança, performances e uma instalação de árvores feitas de cristais por artesãs de uma minoria étnica rural da China.

Tommy Zhong aposta no minimalismo

TOMMY ZHONG: graduado pela Glasgow School of Art, apostou também em um minimalismo delicado.  Muita seda e organza, tecidos naturais em cores nubladas. para vestir direto do escritório para um encontro às margens do rio (onde ficam os restaurantes mais caros).

Wilson Choi faz a Redemptive

WILSON CHOI: é o designer da Redemptive, tentou dar uma perspectiva bem humorada para os problemas da vida moderna. Um exemplo nos conjuntos de jeans fornecido por uma fábrica falida de Hong Kong. A lavagem floco de neve criou efeito vintage, para um toque de atitude rebelde.

A inglesa Stella McCartney fechou a série de desfiles. Afinal, quem não se interessaria por um mercado como a China, mesmo que no momento esteja meio parado? Segundo pesquisa publicada no New York Times, o ranking atual das línguas é: primeiro, o mandarim (pela população chinesa}, espanhol em segundo e inglês, em terceiro. Mais uma razão para cair no mandarim, no Duolingo: brilhante, luminosa, colorida, a julgar pelas cenas de séries como “Entre a razão e a Emoção“, Xangai deve valer as 25 horas de voo (segundo pesquisa da Google)